sábado, maio 19, 2012

Conto: Reescrever & Reencontrar

Estava com medo de voltar, rever todo mundo. Na verdade, eu tinha medo de que tentassem me pressionar para que eu voltasse para sempre. Eu não queria isso, porque eu gostava de viver longe de tudo e todos. É claro que a saudade, às vezes, apertava, principalmente, quando o assunto era família. 
Meus amigos, os de sempre, estava "espalhados" pelo mundo, mas a maioria longe de mim. Era difícil, impossível, eu nunca havia encontrado algum deles andando tranquilamente pelas ruas de Londres e juro que se tivesse encontrado, teria parado, convidado-o para tomar um café. Assim, eu teria um pouco de paz, de descanso, deixaria de lado a correria, a vida dos outros. Sim, porque, queira ou não, eu vivia para correr atrás de celebridades, redigir textos, fotografar e fazer com que a revista fosse o maior sucesso do país. Estudei para isso, sonhei com isso e gosto de viver assim.

Meus pais sabiam que eu estava por chegar, mas não quis dar certeza em datas. Não sei porque, talvez, para que tivessem uma surpresa. Meu irmão, com certeza, estaria na faculdade naquele momento.
Era noite, as estrelas brilhavam no céu. Tudo era diferente há dez anos atrás. Eu até havia voltado ao Brasil, mas não a Santiago. Passei em frente ao colégio, às casas de antigos amigos. Vi minha infância e adolescência enquanto o carro passeava lentamente pela cidade. As coisas não eram as mesmas. 
Tive um impulso e uma pequena vontade de ir caminhando, mas, então, ao abrir a janela, percebi que o Minuano estava gelado, como sempre. 
-Desculpe, mas não perguntei qual é o seu destino. Disse o motorista, um senhor. Eu não o conhecia.
-Por favor, siga reto. Quando for para dobrar, eu digo.
Não quis dizer a rua, o nome do lugar onde eu realmente ia, porque se não, ele diria "-Ah, sim. Sei onde é." e aceleraria.
Eu queria curtir aquele momento. Queria aproveitar, porque aquilo era inédito para mim. Senti-me importante ao ver, em uma loja, um banner com minha foto. Minha mãe havia falado da homenagem e, por saber que naquele ano eu visitaria a Terra dos Poetas, pediu para que a cerimônia aguardasse a minha chegada.

De repente, quando eu menos esperava, ao se aproximar do lugar de destino, vi minha amiga, a minha melhor amiga. Estivemos afastadas nos últimos anos, mas eu ainda sentia um imenso carinho por ela. Lembrei imediatamente de uma tarde no shopping, em que fomos muito felizes. Tempos bons aqueles. Então, comecei a relembrar outros fatos, da muitas noites em que dancei nos CTG's de Santiago e doeu pensar que, talvez, eu nem soubesse mais dançar, se quer, uma vaneira.
Não sei porque não pedi para o motorista parar imediatamente quando reconheci a menina, ou melhor, a mulher. Ela já não era mais uma moça. Eu também não era. 

O carro se aproximava da minha casa e não consegui conter as lágrimas ao ver aquela avenida, naquele inverno rigoroso, mês de junho. Que dia é? Dia 20. Daqui menos de uma semana é o aniversário de alguém especial. Há alguns dias, foi o aniversário do meu melhor amigo. Por onde estaria? É inacreditável que a vida tenha dado tantas voltas a ponto de nos separar. Não! Se a vida tivesse nos separado, eu não lembraria de ninguém, eu não estaria chegando em casa.

-Dobre à esquerda, por favor e depois, à direita.
Era ali. Suei, apesar do frio. Estavam em casa. Pensei em pegar o telefone para avisar que estava chegando, mas resolvi descer do carro. Pedi ajuda ao senhor com as malas. Toquei a campainha e, percebendo que a porta não estava chaveada, abri-a e senti tanto a falta do meu cachorro. 
Meu pai descia a escada apressado, com certeza, assustado.
-Pai, sou eu!
Corri para seus braços.

Um comentário:

  1. Eu chorei lendo teu texto. Primeiro, eu sei bem como é essa sensação entre duas cidades distantes. No meu caso, uma linha entre Porto Alegre e Santiago, no teu caso, uma linha entre um país e outro. Nós temos que optar pelo caminho nosso. Assim, vamos em busca de nós mesmos, de quem somos, do que queremos ser, afinal temos tanto pra descobrir sobre nós mesmos pelo mundo. A saudade faz parte, dos amigos, da família, das ruas, que mudam as cores, até mesmos os nomes. Pessoas começam a criar rugas no rosto, no coração. O melhor disso tudo, é voltar depois de um tempo, abrir os braços e nos darmos de conta, que algumas pessoas e alguns lugares, ainda são nossos. Abrimos os braços, prontos, para envolver tudo aquilo que nos faz bem. A saudade vai embora e fica alívio.

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